Adolescentes representam o Piauí no combate ao trabalho infantil

O Ministério Público do Trabalho no Piauí realizou na última quarta-feira (6) o I Encontro Estadual de Adolescentes pela Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Piauí (Epapeti), que reuniu estudantes de todo o Estado para discutir o tema. Na ocasião, foram formados o Comitê Municipal dos Adolescentes pela Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil em Teresina (Comapeti) e o Comitê Estadual de Adolescentes e Jovens pela Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Piauí (Ceapeti-PI).

O Comitê Municipal elegeu 28 adolescentes de Teresina. Já o Estadual conta com 30 membros titulares e uma suplente, de diversos municípios piauienses, obedecendo a paridade de gênero. Felipe Caetano, de 16 anos, foi o idealizador do Comitê no Ceará e esteve presente na solenidade. “Tive inspirações e apoio de pessoas próximas, como o doutor Antônio Lima. Sentia falta da representação dos jovens em espaços de discussão, para que nos expressássemos sobre nossas ideias, não apenas sobre trabalho infantil, mas também sobre exploração sexual e violência”, ele explica. Para ele, espaços de diálogo como os Comitês ampliam as discussões entre adolescentes. “Entre jovens, o diálogo acontece mais fácil, temos uma linguagem mais parecida. Tenho esperança de um Brasil livre do trabalho infantil. Temos que ser a diferença que queremos ver no mundo”, ele destaca.

A estudante teresinense Dryelle Cristina é membro do Comitê Nacional de Adolescentes na Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Conapeti) desde 2012 e também acredita na erradicação do trabalho infantil. “O sentimento é de gratidão e vontade de fazer mais. Os incomodados têm que fazer a diferença, com denúncia, conscientização, reunindo amigos que estejam em situação de trabalho infantil para dialogar. A erradicação é difícil, mas não impossível. Nós podemos mudar a nossa vida e de outros, ocupando de maneira efetiva os espaços que são nossos”, ela declara.

Durante o evento, os jovens também tiveram a oportunidade de compartilhar experiências, como José Mickael, de Itainópolis. Atualmente com 19 anos, o jovem teve seus estudos prejudicados devido ao trabalho infantil. O estudante conta que começou a trabalhar aos 14 anos. “Eu tive vontade de ganhar meu próprio dinheiro para comprar o que eu desejava e por isso comecei a trabalhar muito cedo. Fazia entrega, trabalhava com salgado, enchia caçamba. É muito cansativo e estudar ficou difícil. Hoje quero recuperar o tempo perdido e não perco aula, tenho boas notas. Primeiro quero finalizar os estudos para poder pensar em uma profissão”, ele narra.

Para o procurador do Trabalho da Ceará, Antônio Lima, secretário-executivo do Conapeti, o caminho para prevenir e combater o trabalho infantil é criar encontros para envolver os jovens nas discussões. “A maioria daqueles que se encontram em situação de trabalho são adolescentes de 14 a 18 anos, o que provoca a evasão escolar, um grande desafio. Cerca de 30% desses jovens que trabalham deixam os estudos. Temos que criar uma consciência cidadã, chamando para a participação e conscientização”, assevera.

Piauí ocupa 1º lugar no ranking

O quadro comparativo dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2014 e 2015 mostra que o Piauí está na primeira colocação do Ranking Nacional do Trabalho Infantil no Brasil, com 9,9% dos casos. A procuradora do Trabalho, Pollyanna Torres, aponta a agricultura, o meio doméstico e as pequenas vendas como as formas mais comuns de exploração no Estado. Entre os motivos para esse cenário estão as dificuldades financeiras enfrentadas pelas famílias. “Com a crise econômica do país, agravou o cenário do Trabalho Infantil, com crianças sendo utilizadas no sustento das famílias. Precisamos buscar alternativas de prevenção e tudo começa na educação”, a procuradora alerta.

Entretanto, o procurador Antônio Lima alerta que o trabalho pode parecer uma solução rápida para as famílias, mas pode prejudicar os jovens em médio e longo prazo. “Mais de 50% dos casos no Brasil estão na área agrícola. A situação pode acontecer por motivos culturais ou econômicos. Ainda há muitos gargalos, temos que incluir essas famílias em programas sociais. No Norte e Nordeste, o trabalho infantil costuma acontecer antes da adolescência, como causa e consequência da pobreza. O lado financeiro pode provocar a situação, mas se a criança não tem o devido estudo porque trabalha, também provocará uma deficiência financeira no seu futuro. Além do próprio trabalho infantil, que afasta crianças e adolescentes das escolas, o trabalho na agricultura ainda põe a saúde deles em risco devido ao uso de agrotóxicos”, ele esclarece.

O procurador do Trabalho, Edno Moura, alerta para as complicações que o trabalho infantil pode ocasionar em longo prazo. “Trabalho infantil não é solução para pobreza. É o início de um grande problema social. As estatísticas demonstram que a população carcerária e os trabalhadores resgatados em situação análoga à de escravos começaram a trabalhar na infância”, salienta.

Para prevenir e erradicar o trabalho infantil, o Ministério Público do Trabalho atua também na profissionalização do adolescente e resgate à infância. “Trabalhamos em três eixos: resgate à infância, com o MPT na Escola, a conscientização de crianças e adolescentes e aprendizagem, para aqueles que querem ou precisam trabalhar poderem fazê-lo de maneira regular”, pontua a Coordenadora Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente – COORDINFÂNCIA, Natalia Azevedo.

Uma das maneiras de conscientização é convidando os jovens para espaços de debate, como os Comitês. O procurador Antônio Lima conta que, desde a fundação do Comitê no Ceará em 2016, houve redução de 75% dos casos de trabalho infantil no Estado. “Ele era o 3º maior estado no ranking, hoje ocupa o 24º lugar”, afirma. Antônio Lima também ressalta a importância da participação dos jovens piauienses por meio da criação dos conselhos. “O Piauí, segundo o PNAD, ocupa 1º lugar em exploração do trabalho infantil, por isso a importância de envolver uma rede de proteção, identificar os casos e fortalecer o combate. É possível encontrar casos no trabalho informal urbano e no ambiente doméstico, que é mais difícil de detectar por acontecer dentro das residências, num ambiente de invisibilidade. Não podemos entrar nos milhões de domicílios, mas podemos entrar nas consciências”, ele garante.

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